segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Anticoncepção masculina - pílula masculina.

Originalmente postado em 6 de Maio de 2009

As tentativas de se atingir um estado de infertilidade passageira, com nivel de falha baixo de métodos anticoncepcionais não-definitivos e segurança, relativamente aos efeitos colaterais, tiveram grande sucesso nas mulheres, que hoje dispõem de uma infinidade de métodos temporários para esse fim.

Eles vão desde pílulas ajustadas para meninas bem jovens, até dispositivos intra-uterinos medicamentosos, de longa duração, utilizados até para abolir as menstruações, passando por uma infinidade de pílulas anticoncepcionais, implantes, injeções, etc. com um variação imensa de doses e combinações hormonais.

Desde o seu lançamento, considerado um marco na sexualidade na década de 60, a “pílula” ou Anticoncepcionais Hormonais Orais (AHO) sofreram constante modificações, objeto de uma pesquisa frenética, para um mercado bilionário privado e público.

Hoje, além da infertilidade passageira, os AHO têm aplicação terapêutica em um sem número de condições ginecológicas, seja como tratamento principal ou mesmo adjuvante (endometriose, menopausa, distúrbios menstruais, ovários policísticos, alguns tipos iniciais de osteoporose, etc.). Alguns de nossos colegas ginecologistas, com os quais convivemos diariamente no Hospital das Clínicas, notabilizam-se pelo vasto conhecimento dos mínimos detalhes e “n” formulações desses medicamentos. Um deles, particularmente amigo, que nos espanta pelo conhecimento vasto e na ponta da língua é o Prof. Nilson de Melo, uma de nossas maiores autoridades nessa área da Contracepção.

Mas como urologistas ficamos com uma verdadeira inveja, no bom sentido, sobre as mesmas técnicas em relação aos homens.
Infertilidade passageira, controlada, reversível e segura é ainda um sonho para os homens.

Muitas são as tentativas para a criação da ‘pílula’ do homem.
Um brasileiro, Dr. Elsimar Coutinho, dedicou grande parte de sua vida científica a isso. Infelizmente com resultados muito modestos.

Notícia recente dá conta que alguns pesquisadores chineses testaram com certo sucesso o uso de undecanoato de testosterona em doses menores do que as encontradas no mercado brasileiro dessa droga, na forma injetável, já utilizada para o tratamento da andropausa, ou mais corretamente, Sindrome da Deprivação Androgênica do Homem, em confortáveis aplicações trimestrais.

O experimento foi conduzido com homens jovens, férteis, com filhos e se extendeu por um período considerável. Segundo o relato chinês todos voltaram a sua condição fértil com a suspensão do medicamento.

É uma esperança, mas que ainda necessita de observação e repetição, com maior tempo de observação, para verificar se junto com os efeitos desejáveis não se observem efeitos colaterais, indesejáveis, em relação à ação do medicamento em outros órgãos e funções.

Explica-se: undecanoato de testoterona é um tipo de testosterona que é metabolizado sem ficar agredindo tanto o fígado, uma grande vantagem sobre a maioria das outras formulações de testosterona, notadamente por via oral, mas que pode, como todas, interferir negativamente no organismo, levando a alterações de comportamento como alterações de humor/euforia, libido exagerada, atrofia do testículo imprevisível, estimulação da próstata (crescimento benigno - câncer (assunto controverso)), além de alterações cardiovasculares, incluindo-se alterações nos lípides (colesterol, triglicérides e frações), com maior chance de AVC (acidente vascular cerebral) e problemas isquêmicos coronários (infarto do miocárdio). Somam-se ainda aumento de pelos corporais, sudorese irregular e alopécia (a carequinha androgênica) e hipertensão arterial. Efeitos verificados em muito menor escala quando fazemos a reposição em pacientes comprovadamente com déficit do hormônio.

Na realidade a história se repete. As primeiras pílulas também tinham efeitos colaterais semelhantes, trocando-se alguns sintomas masculinos por equivalentes femininos, como alterações menstruais, crescimento de pelos, tumores de mama, etc. Muita pesquisa foi necessária para se isolar frações e moléculas com ações cada vez mais específicas dentro do que se desejava, inclusive com doses irrisórias perto da doses “cavalares” dos primeiros AHO.

No homem estamos engatinhando em relação a isso.

A grosso modo, quando ingerimos testosterona exógena existe imediata resposta do organismo no sentido de parar ou diminuir drasticamente a produção da testosterona própria, liberada pelo testículo e de nossos espermatozóides. Quem controla esses níveis e esse funcionamento, o “gerente da fábrica”, localizada no testículo, figurativamente, é a hipófise um pequeno órgão no meio do cérebro que produz dois hormônios comuns ao homem e à mulher (”ordens da gerência para o setor da produção”) chamados FSH e LH - siglas respectivas para Hormônio Folículo Estimulante e Hormônio Luteinizante). O FSH está relacionado diretamente com a produção dos espermatozóides, pela linhagem de células germinativas dos testículos. O LH, por sua vez, está relacionado com a linhagem que lida com a produção hormonal.
Quando existe essa “importação” maciça de testosterona do exterior, como na nossa macro-economia real, a nossa “fabrica” recebe ordens expressas de diminuir a oferta de testosterona “nacional”. Os níveis de FSH e LH caem e o testículo “entra em férias coletivas”. Muitas vezes “férias coletivas” prolongadas “enferrujam” as máquinas que vão se estragando. É o mecanismo que explica a atrofia do testículo. Quando cessa a “importação” a “fábrica” pode estar “sucateada” a tal ponto que não dá mais conta da produção de espermatozóides, que por sua vez, infelizmente, não podem ser “importados” …. Ao contrário, a testosterona tem “máquinas” mais resistentes e rústicas e podem voltar com maior facilidade à produção interna, nos níveis antigos.

Mesmo num testículo atrofiado, que perdeu irremediavelmente, sua “linha de produção de espermatozóides” , a produção de testosterona é retomada e garante o gênero masculino do sujeito.

Esses os problemas dos nossos amigos pesquisadoreschineses, que, aliás, são os que mais pesquisam a anticoncepção masculina. Fácil de entender num país pelas suas dimensões continentais e com uma explosão demográfica, até então contida na marra, através do controle social próprio do comunismo, com retaliações sócio-econômicas para casais com mais de um filho (inclusive com discriminação desfavorável aos bebês e filhos do sexo feminino - uma visão arcaica que mistura a pretensa força de trabalho maior do sexo masculino à visão belicista de soldados potenciais, entranhadas nas filosofias que permearam a revolução chinesa e o comunismo de uma forma geral). São clássicos os fatos de premiar o casal que se esterilizava, após o primeiro filho, ganhando um rádio de pilha, ou as restrições de consumo e outras punições econômicas aos casais que avançam o sinal do segundo filho(a). Mesmo que felizmente essas práticas de controle social (comunistas/ nazistas ???) sejam saudavelmente deixadas de lado, o problema da superpopulação chinesa não deixa de existir e deixar careca os planejadores do governo chinês. A necessidade de planejamento familiar se mantém na mesma proporção das bocas a alimentar, numa população lá pela casa do bilhão e tanto.

Para nós urologistas, a novidade da pesquisa fica apenas pela dose menor do undecanoato, droga já conhecida, contrapondo-se à frustração da ausência de um derivado mais refinado da testosterona, a exemplo dos milhares de derivados estrogênicos que a indústria farmacêutica já desenvolveu em relação às mulheres.

Contribuem ainda para esse panorama não muito animador no campo da anticoncepção masculina vários outros fatores de cunho biológico e sociológico:

1 - o “machismo” ainda impera, notadamente quando existe qualquer sombra de dúvida quando a integridade da sua “indústria nacional” pessoal possa ser colocada em risco (o que, paradoxalmente, muitas e muitas vezes é ignorado, por burrice e/ou cupidez, na utilização das “bolas”, suplementos “batizados” e anabolizantes puros pelas academias e seus atletas sequiosos de se apresentarem “bombados” e fortinhos).

2 - a biologia masculina não ajuda nesse sentido. Enquanto na mulher temos um óvulo a cada 28 dias, em média, liberado homeopaticamente de órgãos duplos (ovários) que já armazenam todos os óvulos, de toda a vida da mulher, na sua fase fértil; no homem temos milhares de espermatozóides, dia e noite, numa “linha de produção de quatro turnos”.
Qualquer “furinho” e podemos ter um espertinho !
No homem temos uma situação que “transborda” continuamente; na mulher temos um evento singelo com um espaço formidável para agirmos.

Se resolvermos os problemas colaterais e garantirmos a reversibilidade de um método anticoncepcional masculino, seguramente a aderência a esse método vai aumentar consideravelmente.

Sai de campo o “machismo” para entrar o “chauvinismo”, na prerrogativa de ter a si o controle de seu poder fecundante, escapando do velho artifício feminino da gravidez marota e do próprio comando do planejamento familiar, hoje efetivamente nas mãos da mulher, mesmo se consideramos o uso do condom, que exibe certa precariedade, sobretudo nos casais mais estáveis, sob uso contínuo.

É esperar para ver.

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