sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Ecologia & Economia - o dilema do politicamente correto que se aproxima

Alguns meios de comunicação deram destaque, na semana curta que se encerrou no último feriado prolongado desse ano, a algumas notícias que parecem não ter nenhuma relação entre si, mas que têm muito a ver uma com a outra.
Na primeira tivemos várias matérias dando conta do trânsito caótico enfrentado em São Paulo, um vilão que reduz em 5% a produtividade econômica em todo o país, só ficando atrás do México. Pior que isso, um trânsito que mata. Para ficarmos apenas no que foi notícia por esses dias, duas pessoas atropeladas por dia também na cidade de São Paulo, quase 70% deles fora da faixa do pedestre. Mas a costura com as outras notícias ficou por conta do congestionamento. O espaço entre um e outro fica cada vez mais curto e, lá por não sei quando, ele vai começar na garagem do cidadão, ao tentar sair para a rua. Na outra face das notícias a crise de alimentos com um aumento de 80% do consumo mundial, puxados pela Índia e China, e um salto nos preços dos alimentos, levando a um desafio enorme a façanha de alimentar 6,7 bilhões de bocas ou os 9,2 bilhões de pessoas de 2050. Nessas últimas semanas não tivemos notícia sobre a água potável, sua escassez, a agressão aos mananciais pela invasão imobiliaria incontrolável, mas sobraram notícias sobre preservação, meio ambiente, desmatamento, agricultura, queimadas, etc.

O ponto é simples. Estime em sua casa quantas pessoas cabem confortavelmente com os recursos disponíveis da casa: camas, lugares à mesa, lugares na sala, uso do banheiro e do chuveiro. Sacrifique um pouco o conforto e inclua mais pessoas. Passe a pensar também nos seus gastos com a manutenção da sua estrutura e alimentação com esse “plus” hipotético. Sacrifique mais, sacrifique tudo, e calcule o máximo de pessoas. Extrapole (”open house”). Talvez esse cálculo seja suportado por um final de semana prolongado ( desde que aquele parente (s) chato (s) não exagere na chatice e assim por diante). Depois disso, meu amigo, vem o caos. Não apenas do espaço, mas dos recursos e até da dificuldade em ratear a conta (supondo que haja inteira boa vontade e disposição de todos os “convivas” para fazer isso…) .
O exemplo pode parecer grotesco, mas não é.

Não se trata de entrar na contra-mão do desenvolvimento e desejar que se vendam menos carros, que se instituam rodízios mais abrangentes, pedágios urbanos, que não se construam outras casas para aqueles parentes que dividem o seu banheiro…
Não, não se trata disso. O crescimento da humanidade e dos países tem mostrado essa opção: novas casas, novas rodovias, novas malhas viárias, transporte público, obras públicas, saneamento, etc.

No entanto, existem alguns recursos naturais que são finitos, existem alguns lugares em que não se pode permitir que aquelas casas a mais sejam construidas, aquela nascente desmatada e ocupada e assim por diante.
Existe ainda uma conta que se bem feita pode apontar o quão anti-econômico seja continuar investindo em mega-metrópoles, que não páram de crescer e cujo sistema de transporte nunca será eficiente, cuja água e esgoto ficarão cada vez mais caros e raros, cuja poluição ficará incontrolável na ausência de sérias medidas restritivas. Isso nos leva ao ponto de que algumas cidades estão no seu limite e a liberdade de alguém ali aportar quando bem entender começe a ser seriamente questionada, até mesmo pensando no próprio bem-estar do pretendente e dos que lá já estão. Politicamente incorreto ?

Isso não é novidade em algumas cidades da Europa. É um dilema do politicamente correto que se choca com outro politicamente correto em termos ambientais e econômicos.

Hoje, maio de 2008, o preço dos alimentos pode ser pago por alguns países, inclusive aqueles com os quais o Brasil compõem o BRIC e experimentam crescimentos ao redor dos dois dígitos. Mas muitos não produzem e estão ficando sem nada, grande parte desses na África e Ásia. Não têm como pagar os novos preços. E todo mundo sabe que não estamos no limite da agricultura no planeta, mas a demanda que a faz crescer não é humanitária, mas pecuniária, sob as leis do mercado.
São dilemas que se avizinham.
PS: A última notícia relacionada foi que em algumas cidades do estado de São Paulo caiu o número de vasectomias e laqueaduras no sistema público e em outras aumentou ( algo em torno de 3 a 4 mil procedimentos a cada 100.000 pessoas - o que em nossa opinião é muito pouco mesmo). Imagine se a China não tivesse implementado algum programa de planejamento familiar…

Originalmente postado em 25 de Maio de 2008

Nenhum comentário:

Postar um comentário