sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Doenças que voltam

Nos últimos anos temos presenciado alguns fatos realmente interessantes, senão trágicos, em relação a algumas doenças relacionadas à esfera da saúde pública .
São doenças que têm voltado à cena.
Nos últimos dias recebemos várias notícias de “surtos” de Doença de Chagas (Tripanossomíase , do Tripanosoma cruzii) por transmissão oral, diferentemente da transmissão pela picada do “barbeiro” um besouro ( Triatomídeo) que ocorria nas zonas endêmicas da doença, em casas com frestas nas paredes e teto, onde o “barbeiro” se acomodava e costumava picar os moradores a noite. No local dessa picada o Triatoma, hematófago, sugava o sangue e, ato contínuo, defecava, sendo as suas fezes contaminadas pelo Tripanossoma ( cruzii de Oswaldo Cruz, que o descreveu), contaminando a pessoa, que as vezes ainda dormindo coçava o local e completava a inoculação do parasita. A doença de Chagas na sua forma crônica apresenta-se em duas formas principais: a Cardiopatia Chagásica, com destruição das fibras cardíacas levando a cardiomegalia e arritmias importantes, que via de regra ocasionam uma insuficiência cardíaca de evolução inexorável, senão controlável apenas; e a forma digestiva com o desenvolvimento de destruição de fibras musculares e nervosas de órgãos como o esôfago e cólon (instestino) originando o que se chama em Medicina como mega-cólon chagásico e o mega-esôfago chagásico.
A fase aguda é passivel de tratamento, mas pode se apresentar com forma de evolução muito grave, rápida e até com morte .


Durante muitos anos a Doença de Chagas vitimou muitos brasileiros, tornando-os pessoas marcadas por triste história de incapacidades.
O exame de sangue que detecta a Doença de Chagas passou a ser obrigatório para os doadores de sangue, pela possibilidade de transmissão transfusional. Um trabalho incansável de Saúde Pública foi sendo desenvolvido para controlar essas endemias.
As casas foram borrifadas com inseticidas para combater o vetor dentro das moradias. Também foram orientadas várias gerações sobre a importância de fechar as frestas nas construções, melhorando inclusive o padrão dessas moradias precárias.
Estabeleceu-se um controle da endemia . Principalmente por educação da população.
Com que tristeza, nós profissionais da saúde, vemos a volta dessas doenças, agora por falta de higiene no manuseio desses alimentos em que os besouros podem ser triturados juntos no seu preparo, ou existe a contaminação pelas suas fezes. Foi um surto de grande repercussão no litoral catarinense em 2005 e agora esses focos no Pará, Amazonas e estados do nordeste. Implicados estão o açaí e a cana de açúcar. O primeiro “batido”, como lá se diz, a segunda moída em pequenos engenhos, para a obtenção da garapa ou suco de cana. Estima-se que os frutos não sejam lavados adequadamente, assim como as máquinas não o sejam. Admite-se ainda que nesses locais, as vezes pequenas barracas, a luz elétrica atraia os triatomas ( que se contam em mais de 30 espécies nativas existentes na Amazônia um grande reservatório natural do Tripanossoma) e estes caiam nos aparelhos para o preparo do açaí e da cana, contaminando o alimento .

Culpar o desmatamento , o meio ambiente que muda, ou o aquecimento global é muito fácil, senão simplista. É uma forma de a sociedade e os órgãos governamentais responsáveis se eximirem da educação em saúde que deixou de existir por todo o país, ou foi descaradamente relaxada. Idem para a febre amarela, idem para a malária, dengue.
Idem para a tuberculose que ainda não ganhou as manchetes …
Talvez falte jornal para o tamanho do problema representado pela tuberculose hoje em dia ! Uma fatura em aberto, sem data para ser cobrada da sociedade, pelo seu caráter sorrateiro e silencioso.
Idem , finalmente para a própria AIDS que voltou a crescer entre as camadas mais jovens.
Não há mistério. Achar que as campanhas que foram realizadas foram um sucesso não é um erro. Mas as gerações continuaram a sua evolução. Essa gente que está chegando não está sendo atingida por campanhas que deveriam ser perenes, sob pena de se invalidar um trabalho de várias décadas, e, no caso das demais doenças de alguns séculos.
Oswaldo Cruz e outros eminentes Sanitaristas devem estar se revirando em seus túmulos !

Originalmente postado em 28 de Abril de 2008.

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